Vamos falar da defesa


Guerreiros, ela voltou. Nas primeiras seis rodadas do Campeonato Brasileiro, aquela que era talvez a grande dor de cabeça do Cruzeiro parecia estar a caminho de um fim. De um início de temporada horrendo, digno dos clássicos de terror, com Vagner Mancini até a chegada e os primeiros jogos de Celso Roth, a defesa celeste passou por muitos momentos de desconfiança, mas aos poucos parecia encontrar consistência e equilíbrio necessários dos bons times. Entretanto, as duas últimas partidas refletiram o que muitos já citavam e recusavam a se convencer cem por cento; de que a defesa cruzeirense estava sólida e preparada para os desafios mais duros do Brasileirão. E realmente não estava.

Em duas rodadas a desconfiança voltou ainda mais forte. Erros de posicionamento, lentidão, a não combatividade e a própria falta de qualidade foram aspectos mais uma vez escancarados a todos. Adversários diretos, como São Paulo e Inter, souberam tirar proveito da situação oferecida pelo próprio Cruzeiro e nos impuseram duas derrotas preocupantes. Preocupantes sim, porque aqueles que acompanharam ambas as partidas puderam ver que o Cruzeiro não jogou “Mancinicamente” ruim, como outrora; fez boas partidas, pressionou os adversários, teve chances. Mas na mesma proporção, deu de presente outras tantas, errou em inúmeros momentos cruciais e demonstrou ter ainda uma defesa frágil, passando a necessitar urgentemente de ajustes e reabilitação.

Concordando com que o companheiro Leonardo Moura afirma em seu último artigo, o Cruzeiro nas mãos de Celso Roth é muito mais organizado taticamente e apresenta plena evolução do que era desde meados de 2011. Roth foi aos poucos caracterizando a equipe com uma marcação forte e boa saída de bola, mas parece ter perdido um pouco a mão na solidez defensiva que dava lampejos de calmaria. Contudo, precisamos ser justos; tal queda é muito mais em função daqueles que de fato entram em campo do que do próprio treinador, também com sua parcela de culpa.

A começar pelo gol. Apesar do crédito e tudo que representa debaixo das nossas traves, Fábio continua com a velha deficiência do chute cruzado. Ao mesmo tempo em que parece se aperfeiçoar cada vez mais nos reflexos e segurança, o capitão não consegue corrigir um antigo problema que o leva a tomar muitos gols dessa forma. Chutes cruzados são o verdadeiro pesadelo de Fábio e já deveria ser uma deficiência sanada a essa altura da carreira. Se discordar, peço a você leitor que faça uma recapitulação e tente relembrar tais situações e verás que não foram poucas. Mas esse é de longe o menor dos problemas no setor.

O miolo de zaga cruzeirense deu verdadeiras mostras de futebol peladeiro nas últimas partidas. Lentidão e falta de qualidade técnica tem sido as palavras de ordem entre Matheus, Victorino e até mesmo o estreante Rafael Donato. O primeiro é o que vemos de fato; é estabanado e não tem passado segurança quando exigido. Já o uruguaio vem decepcionando muito. Quem viu um zagueiro combativo, demonstrando exímio posicionamento e desarmes logo que chegou, não esperaria uma queda tão brusca. Não é de hoje que Victorino vem jogando muito abaixo do que pode de verdade; tem se mostrado um defensor lento e totalmente perdido em seu posicionamento, além de estar sendo facilmente batido pelos adversários na velocidade e nas disputas. A quem diga que um banco lhe faria bem.

Outra explicação plausível pela queda do setor defensivo pode ser o deslocamento do zagueiro Léo para a lateral-direita. Léo vinha fazendo atuações bastante seguras nesse início de trabalho de Roth quando ainda formava a dupla de zaga. Foi eficiente e combativo, obteve excelentes médias nos desarmes e passou a ser um dos pilares da equipe, jogando com muita seriedade e vontade. Mas a contusão de Diego Renan forçou a mudança de posição, onde até vem cumprindo bem seu papel tático, passando a ser uma opção em momentos de desfalques. Entretanto, é necessário que ele volte a sua posição de origem rapidamente e tente dar maior estabilidade ao setor carente, uma vez que Ceará, quando em forma, deve ser o titular pela direita. Já pela esquerda a equipe sofre ainda mais com a improvisação de Éverton, que alterna lampejos curtíssimos no apoio e outros terríveis na recomposição e marcação, deixando constantemente o setor esquerdo vulnerável. Recuperado, Diego Renan – que apresentava certa melhora até lesionar-se – deve retornar por ali. Marcelo Oliveira também precisa voltar a atuar.

Ressalta-se a queda na capacidade de proteção à zaga nos últimos jogos pelos volantes. Agora titular, Leandro Guerreiro ainda precisa se encaixar mais e proteger melhor a defesa, mas por vezes sobrecarregado, enquanto Charles em certos momentos mostra-se relapso nas partidas, pecando muito nos erros de passes. A dupla pode jogar mais do que vem jogando. Já com Tinga e Souza se revezando como terceiro homem no meio, a equipe perde um pouco mais na marcação, mas ganha melhores opções na transição para o ataque. Tinga tem características mais marcadoras que Souza, mas não se limita a essa função, que lhe exige muito. Pelo visto, o esquema de Celso Roth deve permanecer assim, com um terceiro volante que faz às vezes de armador; nesse caso, é necessário ajustar e exigir maior recomposição dessa peça na proteção também.

Outro aspecto que também preocupa bastante é a atual qualidade técnica dos que estão em campo e das opções do banco. É cedo ainda, mas Rafael Donato vai precisar apagar a impressão que deixou na estreia, de ser um zagueiro pesado, apesar do faro artilheiro. Já Thiago Carvalho não aproveitou as chances que teve Mancini, foi inconstante, inseguro e depois sumiu. Matheus não inspira confiança. Fora esses, as opções são jovens da base, mostrando que ainda existe uma carência em número pelo setor. Neste cenário, torna-se ainda mais urgente a necessidade de ajustes por parte da comissão técnica na forma de atuar da equipe.

A defesa que se mostrava sólida nas primeiras partidas precisa voltar a aparecer; atuar em proximidade e com maior consistência. São possíveis correções para os erros de posicionamento não serem tão constantes como vem sendo. Os volantes precisam demonstrar mais eficiência, com mais pegada no meio, diminuindo os espaços dentro de campo. E principalmente, um puxão de orelhas e senhora cobrança por mais atenção e comprometimento dos jogadores, sem exceção. Não precisamos achar que apenas um Thiago Silva resolve, mas é necessário jogar com maior segurança e qualidade; fato.

Há tempo para tais ajustes e Roth parece estar os identificando após os primeiros tropeços. Esperamos que essas derrotas tenham significado o diagnóstico de problemas pontuais que ainda precisam ser bastante trabalhados na Toca para fazermos um campeonato com segurança. Não é o fim do mundo e o Cruzeiro tem evoluído, porém não adianta darmos um passo à frente e dois para trás. Voltar com a solidez defensiva alcançada nesse começo de Brasileiro é a chave para que o resto do trabalho flua em paz.

Foto: VipComm