Domingo sangrento


Hoje não vou falar do Cruzeiro. Quero falar de um fato que atinge indiretamente cruzeirenses e outros torcedores do país: o Coritiba. Saiu a sentença do “domingo sangrento” alviverde: 610 mil dinheiros de multa e mais de 30 mandos de campo retidos.

Domingo sangrentoO Couto Pereira ficará fechado para o Brasileiro em 2010 e em um pedacinho de 2011, já que pela segunda divisão ele só tem 19 mandos de campo. Ano que vem, a torcida do Coxa só vai poder assistir em casa o Campeonato Paranaense e amistosos. É a punição máxima do STJD para o clube. Os invasores de campo que foram presos ainda não tiveram sentença declarada e muita gente que participou da confusão está solta por aí.

É injusto penalizar o Coritiba dessa forma?

Especialistas comentam o caso com diversos pontos de vista. Vou comentar como torcedora de futebol: não é injusto. É óbvio e ululante que a grande maioria da torcida do Coxa é pacífica e está envergonhada com a situação. Mas a pena para o clube é cabível porque ele não tinha noção de que aquilo fosse acontecer – mas era de sua total responsabilidade evitar, por todos os meios, que acontecesse.

Aí vem aquela velha história das torcidas organizadas. Dizer que não tem marginais e vândalos nas organizadas é tão míope quanto dizer que as organizadas são feitas só de vagabundos. As organizadas deveriam cadastrar seus membros e punir quem causa confusão dentro e fora dos estádios. Deveriam, inclusive, ser constantemente monitoradas pelo Ministério Público. E o brasileiro tem que parar com essa história de acabar com as organizadas. Se elas forem realmente organizadas nos critérios da lei e da boa convivência, poderemos ver que, a despeito de incitar a violência, elas são a alma do jeito brasileiro de torcer, com cantoria, bandeiras e todos de pé nos estádios.

Passei por uma situação curiosa em Londres, em um dia de Arsenal x Manchester United. Na capital inglesa, a torcida contra o Manchester é imensa; londrinos são bem bairristas e torcem para o Chelsea e Arsenal na sua maioria. Pois bem. Eu era “vizinha” do estádio do Arsenal, e quando o trem passou por aquela estação, depois do jogo, centenas de torcedores do clube tomaram os vagões. A duas estações dali, entra no meu vagão um torcedor com a camisa do Manchester United. Eu, acostumadíssima com as briguinhas de torcidas por aqui, pensei: “vai dar merda”.

Mas nada aconteceu. Fiquei surpresa com a civilidade da situação e perguntei à minha amiga, que já morava em Londres há algum tempo, se a atitude do torcedor do ManU (entrar em um vagão lotado com a torcida adversária) não era arriscada. Basicamente ela respondeu que se algum torcedor do Arsenal “puxasse o cabelo” do cara, o time poderia ficar sem mando de campo, e o torcedor ir preso e ser banido do estádio para sempre. É claro que ela exagerou na sentença, mas o que ela quis que eu entendesse era justamente isso: QUALQUER agressão ao adversário pode ter consequencias drásticas para o agressor e para o clube.

Quando eu conto esse caso, alguém aí se lembra que a Inglaterra era a terra dos hooligans? Que há 20 anos 96 pessoas morreram no estádio de Hillsborough antes mesmo do começo da partida entre Nottingham Forest e Liverpool, pelas semifinais da Copa da Inglaterra?

É, galera. O que aconteceu ali foi a imposição do poder público sobre interesses dos torcedores e clubes, para que a Inglaterra fosse exemplo de civilidade, depois de ser taxada como o país das torcidas mais violentas do mundo. O Brasil precisa de medidas URGENTES, porque, vamos combinar, já é quase a próxima sede da Copa do Mundo. Vai mostrar o que ao planeta? Que, se sairmos nas quartas de final, alguns torcedores não terão racionalidade suficiente para aceitar a derrota sem querer socar a cara de outro indivíduo?

Essa semana, o Coritiba foi o “boi de piranha” para uma coisa que deve acontecer em todo o país: banimento indeterminado de torcedores e clubes pagando multas altíssimas por seus torcedores vândalos que AINDA vão aos estádios.

Nesse caso específico, uma enfermeira perdeu três dedos da mão dentro de um ônibus, após uma bomba em tumulto com os vândalos do Coxa. Nem torcedora ela era. Ter três dedos a menos, para ela, pode significar uma mudança de vida. Para o presidente do Coritiba, não deve significar nada. E se fosse algum conhecido teu? E se alguém tivesse morrido? É por isso que acho que 610 mil reais ainda é pouco, mas é um exemplo para os outros dirigentes e representantes do Ministério. Psicologia infantil: “viu o que aconteceu com o seu coleguinha? Se você fizer igual, vai acontecer o mesmo com você”.

Vamos exigir do poder público que NOS RESPEITEM! Eu não vou ao estádio para brigar, para causar tumulto, então exijo que, quando eu vá, não seja vítima dessas pessoas, que nem são torcedoras de verdade. Saber perder é tão importante quanto saber ganhar. Futebol é um esporte e ninguém, no mundo inteiro, merece perder mando de campo, dinheiro e – principalmente – três dedos por causa disso. Como dizem os Beatles, não há nada que tenhamos que fazer que não possa ser feito. Tudo o que precisamos (como um país) é ter vontade de mudar.