
07 fev Aha uhu, o Borderô é nosso!

Todo mundo já sabe que, além de poderem visitar o Mineirão e voltar à rotina de ver seu timeco apanhar ali, o pessoal do lado rosa da lagoa teve a honra de ajudar a pagar o Dagoberto.
Graças ao Turco Boquirroto, que fez um contrato de exclusividade com o Puxadinho do Horto e foi chamado gênio pelos amiguinhos da imprensa, a renda do clássico passou a ser exclusiva do mandante e o recorde de arrecadação da reabertura da Toca III veio toda para o bolso do Maior de Minas, ao invés de ser dividida em 60% para o vencedor e 40% para o perdedor, como antigamente. Assim, não podemos esquecer de deixar nosso agradecimento por mais essa proeza do melhor dirigente de 2012.
Posso estar errado, mas não me lembro de tanto escarcéu da imprensa por causa de um borderô. A renda saiu na segunda à noite e primeiro anunciaram que o faturamento do Cruzeiro teria sido “apenas” de cerca 1,6 mi. Sorte que ainda existem alguns repórteres em Minas que mantêm o velho hábito de apurar, como é o caso do Samuel Venâncio, que teve o trabalho de ligar para Fernando Souza, gerente administrativo do Cruzeiro, antes de anunciar que a verdadeira renda líquida do Cruzeiro no clássico foi de R$ 2.192.965,09.
Assim, enquanto parte da imprensa mineira, advogados galináceos chutadores e afins choram copiosamente em suas camas, vamos aos cálculos:
1) Quantos jogos o Cruzeiro precisaria fazer no antigo Independência para chegar a mesma renda do Clássico do dia 03?
O recorde de renda líquida do Cruzeiro no Independência em 2012 foi estabelecido na partida contra o Santos e alcançou a marca de R$ 203.428,59, descontado o valor do sócio-torcedor.
Fazendo o mesmo cálculo para o clássico de domingo, descontando a arrecadação com o sócio-torcedor, o Cruzeiro atingiu uma renda líquida de R$ 1 milhão e 968.385, 09 reais, ou seja, o equivalente a mais de 9 Independências e meio lotados como na partida contra o time paulista.
2) Quanto terá que ser o preço do ingresso do Atlético-MG em um clássico no Independência para chegar a mesma renda líquida do Cruzeiro no Clássico do dia 03, ainda que não descontemos os custos da partida?
Na partida contra o Santos válida pelo Brasileirão, o Atlético-MG teve o seu recorde de renda bruta (todo valor arrecado) no Independência até hoje, alcançando a marca de R$826.305,00 reais.
Parte deste valor, no entanto, foi empregado para pagar os custos da partida, parte do setor corporativo foi entregue a BWA, entre outros descontos que deixaram para o Atlético-MG uma renda líquida R$ 353.308,90, inferior aos R$ 367.038,93 arrecadados pelo CAM na última rodada do campeonato (onde o percentual de ingressos corporativos vendidos e que são divididos com a BWA foi menor).
Ainda que desconsideremos estes descontos e façamos o cálculo mediante toda a renda da partida contra o Santos, com o público de 20.418 presentes (público próximo da lotação máxima) no estádio naquele dia, o Atlético-MG precisaria cobrar o preço médio de R$ 107, 40 reais em cada ingresso para alcançar a arrecadação do Cruzeiro na reinauguração do Mineirão.
Incluindo aí os bilhetes dos sócios, meias-estradas e outros descontos, além de dar o calote nas despesas da partida.
3) Com o antigo esquema de renda dividida, quanto faturaria o clube que perdesse dois clássicos no Mineirão?
No antigo esquema de renda dividida, os clubes perdedores tinham o direito a 40% da arrecadação da partida.
Caso um clube perdesse dois clássicos nesta condição e com os valores arrecadados de domingo, ele poderia ao menos comemorar a quantia de R$ 1 milhão e 754.372,07 reais em seus cofres.
Kalil, porém, firmou acordo com o governador e com Gilvan de que, a partir de agora, a renda será toda do mandante e o antigo sistema de divisão foi abolido.
Para arrecadar com a renda total dos clássicos no Independência o mesmo que conseguiria com meras duas derrotas no Mineirão no modelo antigo de divisão de renda, tomando como base a arrecadação do duelo entre as equipes na última rodada do Brasileirão 2012, o Atlético-MG precisará realizar 4,8 (quase 5) clássicos no Independência. Ou seja, para o CAM sairia muito mais em conta perder no Mineirão e sair com 40%, como era no antigo sistema, do que ficar com 100% da renda dos jogos no Independência, como acordado que será feito daqui para frente nos duelos entre as equipes.

Para ser vantagem mesmo para o Cruzeiro, no entanto, o Mineirão tem que ter uma boa média de público. Se os dois times colocarem 15 mil sempre, o lado rosa leva a melhor, porque tem camarote, naming rights, etc. Embora tenha os custos de manter o estádio, isso dá lucro (se for negociado. Confira ao final do texto o problema naming rights/Engenhão).
Acontece que em um jogo que o Cruzeiro põe 30 mil, por exemplo, ele ganha o dobro. Em um jogo como o de domingo, ganha QUATRO VEZES MAIS, o que compensará, para desempatar na arrecadação média.
Cruzeiro leva vantagem, mas não é uma vantagem tão absurda quanto as contas acima possam sugerir. Estamos trabalhando com o “excepcional”. O que faz o contrato bom para o Cruzeiro não é a comparação com o Atlético, mas a possibilidade de arrecadar muito mais que arrecadaria sem o Mineirão. Porém, para comemorarmos no fim do ano, torcida terá que comparecer.
O certo é, que aquele blá, blá, blá de prejuízo não faz o menor sentido. Isso está mais do que claro. Sem contar que ainda estamos desprezando o fato do Cruzeiro ter museu, loja, mais vagas de estacionamento e etc.
Por fim, ainda que o Cruzeiro ganhasse mais no Independência, ou levasse prejuízo no Mineirão, isso pouco importa. Lugar de time grande é em Estádio grande.
O Cruzeiro tem uma mística com a Toca III. A história do Maior de Minas foi construída ali e é ali que a China Azul quer ver o time jogar.
O Mineirão é nosso, sempre foi nosso, e sempre será nosso!
A polêmica naming rights: O quanto é possível lucrar com a venda do nome do estádio?
“O que o Atlético-MG perderá na bilheteria, ele compensa com o naming rights do Independência”. Quantas vezes os atleticanos usam este argumento, não é mesmo?
Se depender do exemplo do Engenhão, no entanto, esta situação será apenas uma falácia. Vender o nome do estádio secundário da cidade não é tão fácil assim.
O Botafogo agoniza administrando o Engenhão, muito embora seja evidente que o Rio de Janeiro seja uma cidade que comporta e trabalha com um número de eventos superior a Belo Horizonte.
Conforme matéria da Folha em 2011, momento em que o Maracanã já estava fechado, o Botafogo só passou a ter lucro com eventos e os jogos no Engenhão após o fechamento do principal estádio da cidade. Mesmo assim, o lucro de R$ 1,4 milhão em 2010, com o Maracanã fechado por 6 meses e dois clubes alugando o estádio (Fluminense e Flamengo), não compensou os prejuízos (isso mesmo, prejuízo!) botafoguense com a administração do estádio desde 2007, marcado principalmente pelas dificuldades de realizar eventos com a concorrência do Maracanã e a de vender o “naming rights” do estádio.
O clube carioca até tenta, mas ainda não conseguiu encontrar um interessado em comprar o nome do estádio. No ano passado, a diretoria alvinegra chegou a procurar o BMG e oferecer este direito por R$ 18 milhões de reais/ano e depois por R$ 12 milhões, mas ambas propostas foram recusadas pelo banco. Revista Veja.
O Independência compartilha com o Engenhão o fato de ser o segundo estádio da cidade e estar fora da Copa do Mundo. Mesmo os estádios que estarão na Copa, aliás, estão com dificuldades de vender o seu nome, especialmente pela postura da Globo de se recusar a falar o nome do dono da marca (a emissora carioca estuda mudar a diretiva, desde que parte do dinheiro do “naming rights” vá para o seu bolso). Como desvantagem, tem a menor capacidade de público (praticamente metade do Engenhão), estar em uma praça menor (Belo Horizonte atrai menos investimentos que o Rio) e o agravante de estar em um bairro residencial, com eventos causando transtorno e causando reclamações de moradores, como no show do David Guetta em 2012.
Diante da dificuldade de se negociar os nomes de estádios mais importantes e mais bem avaliados e os valores postos nas negociações que já foram abertas, longe de serem excepcionais, cabe lembrar ainda que o Atlético-MG investiu R$ 8 milhões na reforma do estádio e que terá que o devolver ao governo daqui a 9 anos e meio, sem garantias de que poderá seguir com o mesmo acordo com o vencedor da próxima licitação. Além da obrigação de arcar com metade de todos os demais custos do estádio.
Como diria aquele velho e oportuno ditado e de olho na situação do Botafogo, contar que o fator “naming rights” e o direito de arrecadar com eventos paralelos farão a diferença na desvantagem na capacidade de público do Independência em relação ao Mineirão é, literalmente “contar com o ovo na cloaca da galinha”.
Foto: Marcos Michelin/EM/D.Apress