Vanderlei Luxemburgo: O verdadeiro amor de Gilvan


O que você fazia no dia 12 de junho de 2015? Quem passou o dia ao lado da pessoa amada, certamente se lembra desta data. Aqueles solitários que bebemoram ou afogaram suas mágoas em um (ou vários) copo de cerveja nas festas que celebram ou lamentam o fato de se estar solteiro também. E o presidente do Cruzeiro, Gilvan de Pinho Tavares, fazia uma verdadeira declaração de amor ao então recém-chegado ao Cruzeiro, Vanderlei Luxemburgo.

É importante lembrar que Luxemburgo é alvo do desejo do mandatário celeste há muito tempo. No dia 22 de Setembro de 2011, o então candidato a presidência do clube deu a seguinte declaração, publicada no portal Lancenet!

“Eu sou admirador do Vanderlei Luxemburgo. É uma pessoa competente pelo trabalho que já fez. Inclusive pela sua passagem pelo Cruzeiro. Além de reconhecer a competência dele, eu gosto dele e sou amigo dele. Eu tenho certeza que nos daríamos muito bem se por acaso ele se tornar treinador do Cruzeiro. Mas essa decisão, hoje, depende do atual presidente do Cruzeiro Zezé Perrella, e eu vou bater palmas para ele, caso venha. É realmente o nome que teria o perfil que a torcida gostaria de ver no comando do futebol do Cruzeiro.”

Gilvan assumiu o clube no início de 2012, mas manteve o treinador Vágner Mancini no cargo. O mau início de ano culminou na demissão do comandante do 6X1, mas Luxemburgo estava empregado no Grêmio. Sem ter como realizar seu desejo de campanha, Gilvan acabou contratando Celso Roth, responsável pela equipe até o final da temporada.

Em outubro de 2012, porém, o diretor de futebol Alexandre Mattos foi visto no Rio de Janeiro ao lado do então treinador do Vasco Marcelo Oliveira. Ambos acertaram na ocasião que Marcelo seria comandante em 2013, o que só foi anunciado algum tempo depois.

A torcida celeste, em função da pouca experiência de Marcelo e de seu passado no Atlético-MG, em sua maioria recusou o treinador. Gilvan, porém, manteve sua palavra. Talvez porque Luxemburgo estava ainda no Tricolor Gaúcho. Vai saber.

Marcelo conquistou o bicampeonato brasileiro em 2013/2014 ao lado de Gilvan e Alexandre Mattos. Vanderlei Luxemburgo, por sua vez, foi rebaixado com o Fluminense em 2013 e ficou a edição de 2014 tentando escapar da zona da confusão com o Flamengo.

Veio 2015. O elenco celeste perdeu peças importantes e foi remontando. Com Marcelo Oliveira, a equipe oscilava e avançava aos trancos e barrancos na Copa Libertadores e no Campeonato Mineiro, onde perdeu a liderança da fase classificatória na última rodada ao perder para o Tombense em pleno Mineirão. No estadual, eliminação após uma semi atribulada no extra-campo e erro de arbitragem de Heber Roberto Lopes que simplesmente ignorou aviso do 4° árbitro que Leandro Damião havia sofrido falta. Na Libertadores, triunfo sobre o São Paulo e eliminação para o River Plate com uma contundente derrotada por 3X0 no Mineirão, após vencer o rival na Argentina por 1X0 no jogo de ida.

Vanderlei Luxemburgo, por sua vez, seguia no Flamengo. Perdeu o Campeonato Carioca, os reforços que indicara não davam liga e na 3ª rodada do Campeonato Brasileiro estava livre. Rodada que antecedeu a eliminação celeste na Libertadores. Veio a 4ª rodada, estreia dos titulares no Brasileirão, derrota para o Figueirense. Gilvan enfim tinha a chance de realizar o sonho de trazer seu “amigo”, como definiu Luxemburgo em 2011. Com Marcelo questionado e Luxemburgo livre, anunciou ao bicampeão brasileiro sua demissão na reapresentação do clube (Marcelo, inclusive, havia montado a lista de relacionados para o confronto contra o Flamengo que ocorreria no dia seguinte) e, uma hora depois, o acerto com Vanderlei Luxemburgo.

O início de Luxemburgo empolgou. Três vitórias seguidas, mantendo o esquema tático utilizado no primeiro semestre e realizando uma ou outra alteração no time titular de acordo com circunstâncias (lesões, suspensões ou convocações). Após as duas primeiras vitórias, porém, Gilvan estava empolgado.

Chegamos enfim ao dia 12 de Junho de 2015. Dia em que Gilvan pela única vez na temporada assumiu um erro. Em seu entendimento, Marcelo deveria ter caído antes. Já na derrota contra o Tombense. Porém, o sonho de trazer Luxemburgo, na época recusando proposta do São Paulo para se manter no Flamengo, não seria possível naquele momento.

Gilvan mostrou toda sua empolgação com Luxemburgo e sua primeira semana no clube em entrevista publicada pelo Superesportes. Mais de dois meses depois, é curioso notar que os “acertos” e “resultados” de Luxemburgo não se realizaram. E o presidente celeste, todo orgulhoso de enfim ter trazido o pentacampeão brasileiro que há uma década não vence nada mais que um estadual, sumiu de cena e reapareceu nesta quinta-feira no clube para dar apoio ao “amigo” e ao grupo de atletas.

“Desde o jogo contra o Tombense, achei que já era a hora. Mas o time também começou a mostrar uma certa reação e aí demos uma segurada. Mais à frente, jogamos uma péssima partida contra o São Paulo na Libertadores e merecíamos ter tomado uma goleada enorme, não fizemos nada para mudar dentro de campo. Como foi um placar mínimo fora, poderíamos inverter em casa. E nós escapulimos de tomar uma goleada histórica contra o São Paulo. Contudo, na volta em Belo Horizonte, o Cruzeiro teve uma pegada diferente, um comportamento bem diferente. Achei que dava para continuar, pois fizemos cobranças e os atletas passaram a render mais. Contra o River Plate, na Argentina, o time teve um procedimento idêntico. Mas depois voltamos a Belo Horizonte, voltou aquele marasmo, voltou aquela mesma coisa, e aí não dava mais para segurar. Eu tinha que fazer qualquer coisa e a troca mostrou que a gente estava certo.”

Nota-se que Gilvan avaliava não só os resultados, mas a postura do time durante o período de Marcelo Oliveira. A classificação sobre o São Paulo ou a vitória sobre o River na Argentina não agradaram pela atuação do clube. Com Luxemburgo, por sua vez, os resultados bastavam. As vitórias contra Flamengo e Atlético-MG mostravam que ao decidir mudar o treinador, o mandatário “estava certo”.

“São palavras novas que os jogadores passam a ouvir. É uma pessoa mais motivadora, que com a experiência que tem, nós sabíamos que tinha muito a oferecer para o Cruzeiro. A gente vê que foi acertada a mexida. Pode ter sido demorada, mas foi acertada. Fui criticado por ter sido precipitado, mas na realidade eu poderia ter tomado essa decisão um pouco mais cedo”.

Luxemburgo na ocasião tinha realizado não mais que duas sessões de treinos com o elenco. A escalação mantinha-se como na época de Marcelo Oliveira. Sem muito o que destacar em termos de inovação tática ou técnica do time com o novo treinador, Gilvan foi contundente. A experiência e a capacidade motivadora de Luxa já haviam mostrado que decisão era acertada.

“Foi muito difícil. A gente ponderou muito, conversou muito e discutiu internamente muito o que teria de ser feito, qual a forma e o momento. (A demissão) Teria acontecido alguns dias antes do que aconteceu. Mas pesou a situação dele com a mãe, que estava muito doente em casa. (O Marcelo) Trouxe a mãe para morar com ele, depois veio o falecimento dela, o luto. A gente esperou o quanto pôde, mas infelizmente o presidente do clube que assume a responsabilidade que eu assumi tem que tomar as decisões. Não podemos deixar levar pelos nossos sentimentos de amizade e respeito ao trabalho que foi feito se as coisas estão deixando de acontecer. Se o time passou a render menos e os jogadores não produzem a mesma coisa, é preciso sacudir e mexer. Ele ficou dois anos e meio no Cruzeiro, nos ajudou a conquistar títulos e somos muito gratos a ele. Mas a vida do clube continua. E nós vivemos de vitórias. O torcedor não aceita derrotas”

Gilvan revela neste trecho que Marcelo poderia ter caído dias antes não fosse a morte da mãe do treinador um dia antes da decisão com o River Plate. De fato, Luxemburgo já estava disponível no mercado. Marcelo teve mais uma semana. Perdeu para o Figueirense e foi demitido na reapresentação, já com Luxemburgo acertado.

“Hoje não vejo nenhum time melhor que o Cruzeiro. Nós fomos obrigados a vender alguns jogadores, pois os valores oferecidos a eles eram muito altos e não podíamos concorrer com clubes de Europa, Arábia e China. Mas trouxemos peças de reposição à altura e que podem render bem. O Gabriel Xavier é um exemplo. Por insistência nossa, começou a jogar e caiu no gosto da torcida do Cruzeiro. E nesse jogo contra o Atlético, mostrou o potencial dele. Foi por teimosia, pois nós pedimos para que ele fosse lançado. O Alisson também não é teimosia. Se ele voltar a jogar com regularidade, sem essas interrupções de contusão, tem um potencial imenso. Era considerado até pouco tempo pelo ex-treinador Alexandre Gallo o melhor jogador da Seleção Brasileira Sub-20. O Luxemburgo também disse isso. Tanto que pediu ao Alisson para ir para cima do Atlético no clássico, pois ele é diferenciado”.

A parte mais relevante da entrevista. Neste momento, Gilvan mostra que palpitava nas escalações de Marcelo. Um dos motivos da queda do treinador seria, por exemplo, ter aproveitado pouco o meia-atacante Gabriel Xavier, o que só teria mudado por pressão da diretoria. Curiosamente, Gabriel fez 19 jogos na temporada, 14 deles no período Marcelo Oliveira. Com Vanderlei Luxemburgo, apenas 5. As duas do período de encantamento e apenas mais três nos dezesseis jogos seguintes. Parou de opinar na escalação ou o pouco aproveitamento de Gabriel deixou de ser problema?

“O Luxemburgo acha que o time do Cruzeiro tem potencial grande e pode brigar pelo título brasileiro. Não sabe se será campeão, mas tem condições. A gente vê de novo o time do Cruzeiro brigando para conquistar títulos”

Assim como Luxemburgo, que se apresentou agradecendo a oportunidade de poder conduzir a Raposa na disputa pelo tricampeonato, em Junho Gilvan entendia que o elenco celeste era digno da disputa pelo título nacional. A demissão de Marcelo e o início de Luxemburgo sustentavam esta confiança que atingiria patamar ainda maior após a vitória sobre o Vasco selando a terceira vitória seguida de Luxemburgo.

O amor de Gilvan por Luxemburgo seguiu. A procura por um diretor de futebol se encerrou com a contratação de Isaías Tinoco, indicado pelo treinador cinco estrelas. O estranhamento foi grande. Gilvan anunciava que a demora em encontrar um profissional para a função era a busca por alguém de confiança, mas de repente anunciou um diretor com um passado atribulado e envolvido em polêmicas como o aliciamento do volante Eduardo para assinar com determinado empresário quando comandava o futebol do Guarani.

Nas contratações, Luxemburgo também teve moral. Marinho e Uillian Côrrea, indicados pelo treinador, chegaram. Os pedidos de Marcelo Oliveira por Robinho, Gabriel, Arouca e Leandro Almeida, por exemplo, não se realizaram. Chegaram Seymour, Riascos e companhia e o treinador foi cobrado a se virar com o que recebeu.

O trabalho de Luxemburgo seguiu. Nos quinze jogos seguintes, apenas 3 vitórias. O esquema tático mudou e os treinos escassearam ou se tornaram atividades leves. Na preparação para os confrontos contra o Palmeiras pela Copa do Brasil, por exemplo, nenhum treino tático ou técnico com titulares. A coroação foi a atuação desastrosa da dupla Bruno Rodrigo e Paulo André na eliminação no Mineirão após a saída, sem explicação de Manoel da equipe.

O coro de adeus Luxa foi a tônica da reta final do jogo. O Palmeiras, tirando o pé, permitiu ao Cruzeiro diminuir o que poderia ser um vexame sem precedentes. Na coletiva de imprensa, jornalistas como Arthur Morais faziam o patético papel de assessor de imprensa do treinador e valorizavam seu trabalho, contrariando números e ignorando as várias queixas da torcida. Em uma semana que o diretor de futebol indicado pelo treinador mostrou não saber o tamanho do clube que representa ao questionar o fato de a China Azul ser a maior torcida de Minas.

Fato é que todo mundo já enxergou que a permanência da dupla Luxemburgo e Tinoco pode levar o Cruzeiro ao buraco e ao inferno da Série B. Exceto Gilvan que ainda não entendeu que o sonho Luxemburgo é um pesadelo (Como Santos, Palmeiras, Atlético-MG, Grêmio, Flamengo e Fluminense vivenciaram recentemente). Bem dizem que o amor é cego!

Por: João Henrique Castro