O ingrediente cruzeirense que muitos se esquecem: a mentalidade


Entre uma imprensa esportiva e torcedores que clamavam mudanças após o humilhante 7×1 do futebol brasileiro na Copa, vemos mais do mesmo. A crônica recusa-se a refletir sobre as próprias estagnações, antes mesmo de bradar aos sete cantos por mudanças. Após nova rodada de Brasileirão, mesmo com dificuldades iniciais normais, o Cruzeiro engoliu mais um adversário e o que ouvimos e lemos por aí são as mesmas análises rápidas, não abrangentes e até preguiçosas do trabalho realizado no lado azul por quase três anos. Longe de esperar holofotes apontados ao clube a todo momento. Sabemos o quanto funcionamos melhor se humildes e desapercebidos. A questão é que faz-se necessário valorizar algo além do batido “o Cruzeiro tem um grande elenco” e outras variações de frases Pachequistas.

O que testemunhamos no Cruzeiro hoje vai além do que ter um amontoado de boas opções para um elenco de futebol. É mais uma questão de mentalidade que fora retomada, reformulada e aplicada, desde a concepção da atual diretoria. Não esqueçamos 2012. Naquele ano, sem caixa ou mercado, com a casa em desordem e abandono completo, a ordem era sobreviver e arar a terra para o que viria. Com a mentalidade de recolocar o Cruzeiro no cenário do futebol após um longo inverno infrutífero, arregaçamos as mangas e mãos a obra. Ninguém notou, ninguém falou nada. Nem mesmo a torcida foi capaz de perceber o que era proposto, algo natural em um cenário de futebol brasileiro viciado em agir apenas sob a dialética de resultados e placares de jogos.

Reformulou-se o planejamento, departamento de futebol, o programa de Sócio-Torcedor, voltamos à nossa casa, passamos a flertar com ambições maiores outra vez e, acima de tudo, plantou-se na torcida a mentalidade de que era preciso confiar no trabalho, que em campo as coisas voltariam a funcionar. A chegada de Marcelo Oliveira é tradução literal desse processo inteiro. Tão rejeitado pela torcida no início, o treinador é hoje mais respeitado que muitos dos próprios jogadores que vestem a camisa. Pediu-se um voto de confiança, um voto à retomada daquela mentalidade do Cruzeiro ofensivo, de toque de bola, feito com valores da casa, avassalador em seus domínios e que envolve tanto em campo quanto nas arquibancadas. Voto dado, voto sendo cumprido.

Em campo acompanhamos um time unido por uma corda invisível, com os nós bem atados pela comissão técnica, jogadores, direção e torcida. Jogar coletiva e ofensivamente é a mentalidade firmada quase que como um pacto com a torcida, de contrato e tudo. Exemplo disso: entram e saem jogadores no time, mas todos jogam da mesma maneira, buscam a mesma intensidade e objetivos. Nessa hora compreendemos o que foi proposto lá atrás; menos importa ter três jogadores por posição, mas sim uma mentalidade de clube e jogo implantada, para que os mesmos comprem a ideia. Tecnicamente demonstramos superioridade, fruto exclusivo do trabalho sério e humilde de todos, mas sem menosprezar ninguém. Também tropeçamos, para reafirmar a todos que somos passíveis de falhas e que os pés devem estar sempre fincados no chão. Basta ver e ouvir os discursos, sem exceção, nas vitórias ou derrotas.

Futebol é metáfora da vida: incerto, porém fascinante. Essa retomada de mentalidade que mescla fatores externos às quatro linhas e é refletida justamente dentro de campo poderia dar certo ou não. Contudo, são nas incertezas da vida e do futebol que somos desafiados a criar maneiras de remar contra a maré e prosseguir. Não há fórmula pronta, tudo passa por uma questão de mudança de mentalidade. E o Cruzeiro é a própria mudança que ele queria ver. Fizemos isso e aos poucos vamos colhendo os frutos com humildade.

Para quem vê de fora, como uma imprensa acomodada – salvas as poucas exceções – e torcidas rivais, o Cruzeiro continua sendo o amontoado de jogadores em um elenco, que atravessa o caminho de sorte, se aproveitando da fragilidade do atual futebol brasileiro. Deixemos estar. È tudo uma questão de mentalidade.

Por: Luiz Guilherme de Almeida