Carta aberta a Zeca Franco, Bruno Tostes e Fred Melo Paiva


Nas últimas semanas, uma polêmica de pouco efeito prático tem tomado conta do futebol mineiro. Qual é o verdadeiro time do povo do estado de Minas Gerais?

Questiono os efeitos práticos da discussão, pois os ingressos dos jogos de Cruzeiro e Atlético Mineiro seguem inacessíveis para a maior parte da população e ainda que os clubes tenham buscado neste intervalo de tempo operar ações concretas como o Setembro Dourado (Cruzeiro) e a contratação de trabalhadores refugiados (Atlético-MG), penso que ambos fazem muito menos do que poderiam em prol dos mais necessitados.

Dentro desta discussão, porém, tem chamado a atenção a publicação de mentiras sobre o passado do Cruzeiro Esporte Clube por blogueiros atleticanos, algumas delas em espaços de mídia relevantes como o Globo Esporte.com (Bruno Tostes) e Estado de Minas (Fred Melo Paiva). Entre as falsas afirmações, constam acusações de que o Palestra Itália era uma instituição fascista ou que em determinado momento da história não admitia a presença de negros em seus quadros. Afirmações que os autores julgam ser verídicas a partir de meias verdades como a manifestação de apoio ao governo de Mussolini por um ex-presidente palestrino em 1923 (portanto postura pessoal e não institucional, assumida 15 anos da publicação do Manifesto das Raças quando, em função da aproximação com a Alemanha Nazista, o fascismo italiano incluiu medidas raciais em seu corpus jurídico) ou a cláusula no Estatuto do clube que entre 1921 e 1925 admitia em seus quadros apenas italianos ou descendentes, sem nenhuma restrição de cor, credo ou outra característica.

Nos últimos dias, tenho tentado via twitter contato com os autores destes textos com a seguinte questão: “Você afirma que o Palestra Itália em algum momento recusou negros em função da cor de sua pele?” A pergunta é relevante, uma vez que a existência de grêmios recreativos nacionais era evento comum no início do século XX e tais restrições se limitam a ascendência geográfica, independente da cor da pele, reitero. Nenhum dos dois me respondeu.

Entre os propagadores destas acusações levianas, encontra-se Zeca Franco (@zeca1908) que tem contribuído com a divulgação dos textos acima mencionados e afirmado categoricamente que a instituição Palestra Itália era racista e fascista. Em função disso, inclui-o também como sujeito a responder tal questão, propondo aos três nomes citados (Bruno Tostes, Fred Melo Paiva e Zeca Franco) um debate de duas horas de duração, com mediador a ser escolhido por quem topasse com a condição de que as duas partes pudessem ter o mesmo tempo de fala.

Zeca foi o único que se manifestou. No entanto, exigindo um cachê de 1500 reais para participar, pagos a vista e antecipadamente, comunicando ainda que “se tiver mais grana ai talvez eu consiga convencer o Tostes e o Fred a participar, ai vc vai ficar famosão mesmo hein”, como se o meu intuito com a questão fosse algum tipo de promoção pessoal.

Motivado pela necessidade que acho que o tema demanda em ser debatido com seriedade, eu topei a situação. Confesso, contudo, que o fato de um sujeito cobrar 1500 reais para representar as cores do seu clube em um debate entre torcedores me  incomoda. Sugeri, portanto, que já que o debate envolve o caráter popular dos clubes, seria de bom tom que o dinheiro fosse doado a uma instituição de caridade, ao que Zeca respondeu inicialmente que daria uma parte, mas, ao ser confrontado pelo perfil @FabioModestoS respondeu: “vou fazer a caridade de doar um barril de chopp para meus amigos carentes, tiramos fotos quando formos beber”.

Reitero que tal situação me incomoda. A quantia me parece exagerada para um debate do qual, por amor ao Cruzeiro Esporte Clube e sua história, eu aceito participar de graça, seja com Zeca, Bruno Tostes, Fred Melo Paiva, ou qualquer outro atleticano que esteja disposto a sustentar em um debate a versão do passado fascista ou racista do Palestra Itália. Além do fato de tal despesa ser elevada para o meu orçamento, me parece que a disposição de Zeca em cobrar para participar deste debate seria mais justa se revertida em caridade.

Escrevo este texto, portanto, para propor a Zeca que o seu “cachê” seja revertido em 15 doações de 100 reais mensais (os primeiros 1200 reais já foram cadastrados no meu cartão de crédito como comprovo abaixo) para a Casa de Acolhida Padre Eustáquio que cuida de crianças com câncer. Não exijo em troca que Zeca faça qualquer doação, uma vez que minha participação sempre foi e será gratuita, embora fosse de bom tom que dentro de suas possibilidades assim também o fizesse.

A proposta é endereçada direta e publicamente a Zeca, mas caso o mesmo mantenha o apreço por seu “cachê” e Bruno Tostes, Fred Melo Paiva ou qualquer outro atleticano que compartilha da visão sobre o passado do Cruzeiro Esporte Clube destes mencionados, aceitem participar em seu lugar, mantenho a proposta da doação para a instituição acima referida (já realizada em parte, inclusive), além de convidar para que outros tantos possam conhecer o trabalho desta organização e também contribuir de alguma forma.

Em função de julgar o debate necessário para um tratamento responsável da memória do futebol mineiro, contudo, mantenho o compromisso firmado com o “cachê” de Zeca e caso o mesmo não se disponha a doá-lo ou nenhum substituto o faça, minha palavra será mantida e Zeca receberá 1500 reais para participar podendo usar o dinheiro como bem entender como era sua proposta inicial. Infelizmente, contudo, não tenho condições de comprometer 3000 reais do meu orçamento e seria obrigado a cancelar a doação a CAPE para custear o cachê que Zeca cobra para defender seu clube por 2 horas.

Em função de eu não residir em Belo Horizonte, o debate está inicialmente marcado para o dia 30 de Outubro, mas considero a possibilidade de realizarmos um hangout para antecipar sua realização, desde que Zeca ou quem aceitar as condições propostas assim consinta.

Abaixo, a comprovação de doação dos primeiros 1200 reais a Casa de Acolhida Padre Eustáquio.

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Por: João Henrique Castro