A imposição para ser sócio e o descaso com o “torcedor comum”


Após o gigantesco crescimento do programa de sócio-torcedor do Cruzeiro Esporte Clube nos últimos dois anos, fruto de um excelente trabalho coordenado pela diretoria do Cruzeiro e pelo departamento de marketing do clube celeste, criou-se uma nítida diferenciação no que diz respeito ao tratamento para com aquele torcedor que é sócio e para com aquele torcedor que não é sócio. Criou-se até um nome para o não-sócio: “torcedor comum”.

Esse “torcedor comum”, que muitas vezes foi o grande responsável por fazer grandes festas nas arquibancadas do Mineirão, hoje encontra algumas dificuldades para ter acesso ao estádio e também tem de lidar com um sentimento de desprezo por parte do clube, uma vez que o sócio-torcedor agora é a bola da vez.

Ninguém discorda que o programa de sócio-torcedor é um excelente investimento para o clube e para o próprio torcedor. Todos sabem o quão importante é para um clube ter um grande número de associados. Entretanto, acredito que o clube não pode se esquecer daquele torcedor que não tem condições de aderir ao programa e/ou daquele torcedor que simplesmente opta por não ser sócio do clube.

Atualmente, percebo uma política de imposição: seja sócio, seja sócio, seja sócio! Assim, no imperativo. E se você não aderir ao programa por bem, vai acabar aderindo por força maior, já que os privilégios para compra de ingressos só o sócio-torcedor é quem possui. Entendo que essa maneira impositiva de ganhar adesão de sócios é até inteligente, embora seja um pouco cruel.

SOCIOFUTEBOL21012013Eu sou estudante e não moro em Belo Horizonte. Para mim, os atuais programas de sócio-torcedor não me atraem. Os que temos hoje para quem mora no interior ou fora do país não nos dão muitos privilégios. Geralmente você paga uma pouca quantia e pode retirar seu bilhete pela internet, evitando filas. Ok, mas quem mora fora da capital não costuma ir aos jogos (por causa dos custos com deslocamento, alimentação e ingresso) e nem sempre pode simplesmente pagar determinada quantia para o clube só para poder contribuir. Se eu pudesse, com certeza faria isso, sem o menor problema. Além disso, as melhores promoções não atendem a todas as categorias de sócio. E nem precisa ser assim, é óbvio. Mas só estou dando algumas justificativas que, com certeza, muitos outros torcedores que não são sócios do clube também compartilham.

Focando mais na realidade daquele torcedor que não é sócio, mas que mesmo assim frequenta bastante o Mineirão, conversei com alguns torcedores do Cruzeiro sobre essa questão do “descaso” do clube com o “torcedor comum”. Um desses torcedores é o auxiliar administrativo Clayton Oliveira, de 31 anos, que diz se sentir abandonado pelo clube:

“Depois que foi criado o programa ‘sócio do futebol’, a diretoria simplesmente abandonou seus torcedores comuns, se esqueceram de quem construiu a história do futebol, que é aquele torcedor que muitas vezes tinha no futebol a única diversão e a única forma de viver um momento alegre com seu filho. Hoje vemos dirigentes preferindo estádios com 15 mil sócios do que com 50 mil torcedores. Precisamos de respeito, pois nem todos podem pagar um sócio do futebol e isso não nos faz menos apaixonado pelo clube.”

Na mesma linha de raciocínio, o cruzeirense Júlio César Pereira dos Santos, de 28 anos, afirma não haver diferenças entre o sócio e o não-sócio e exige respeito:

SOCIO04022013“Quando reunidos no Mineirão, para vibrar, incentivar e cobrar, somos apenas um. Somos uma só voz, um só sentimento. O que importa é o Cruzeiro. Não interessa classe, status, raça ou credo. Somos uma só torcida, apaixonada e vibrante. Que seja assim em todos os momentos e que vejam que o não-sócio dessa forma. Se não podemos nos associar, então que não nos tire o prazer de irmos ao campo para torcer. Queremos e merecemos a mesma atenção, respeito e carinho. Somos apenas um, somos Cruzeiro!”

Outra situação que o torcedor, em geral, encontra dificuldade na hora de adquirir seu ingresso é a burocracia. Para quem precisa de um bilhete de meia-entrada, por exemplo, como o estudante de publicidade Danilo Oliveira Moraes, de 18 anos, é necessário ter em mãos um comprovante de matrícula impresso. Sobre essa situação, Danilo comenta:

“As condições para comprar meia-entrada para estudantes são restritivas porque não se pode comprar apenas com carteirinha. Só com declaração. Inclusive já vi pessoas que não conseguiram comprar por não terem a declaração impressa.”

A mesma dificuldade enfrenta o estudante de biblioteconomia Daniel Novaes da Silva, de 21 anos, que questiona:

“Eu mesmo já deixei de ir ao Mineirão por causa dessa burocracia toda. Pra mim, não faz sentido, já que uma carteirinha oficial da universidade (desde que tenha validade) comprova minha situação na universidade tanto quanto um comprovante. E digo mais: o comprovante, eles aceitam xerox (já que eles carimbam quando você compra, não vou deixar que carimbem meu único comprovante original) e isso dá margem a falsificações. Digitalizar um desses documentos no adobe, converter em word, editar os dados com o nome que quiser não é nada difícil. Com a carteirinha não dá pra falsificar.”

Apesar da indignação de muitos torcedores que não são sócios, como é o caso de Clayton, Júlio, Danilo e Daniel, os quatro reconhecem a importância do programa. Danilo diz que “o programa do Sócio é bem elaborado, mas muitas vezes faltam ideias criativas para preencher mais o estádio ou ‘chamar o torcedor’” e Daniel acrescenta: “Não me sinto desprezado, não. Mas eu acho que deveriam melhorar nesse sentido da venda de ingressos. Uma sugestão é vender pela internet. Concordo com a vantagem dos sócios poderem comprar antes, mas acho que após esse período a venda online deveria ser estendida a todos os torcedores e mantendo a venda nas bilheterias, também.

Por: Pedro Henrique Campos